20 de fevereiro de 2015

3:00

   A escuridão faminta, engolia tudo, até que a luz vermelha acordou Carolina de seu sono sempre leve. Abriu a pálpebra pesada. Com os punhos, esfregou os olhos secos.
   Alguma coisa estava debaixo da cama.
  A noite era quente, porém chovia torrencialmente lá fora. Os trovões iluminavam toda a cidade rapidamente, para, logo depois, entregá-la às trevas úmidas e quentes.
  Puxou o cobertor, que havia sido chutado no meio da noite, para perto de seu peito nu. Tornou a abrir os olhos, agora no estado perfeito de visão. A luz ainda residia abaixo da cama. Uma luz constante e forte estava acesa misteriosamente embaixo de seu leito. O que diabos era aquilo? Todos os pelos eriçaram diante da coloquial expressão. O frio lambeu seu o corpo. Sentia terríveis calafrios indo e voltando... e voltando.
   "O que está aí?", disse fracamente, numa evidente tentativa de autoridade. "Eu tenho aula amanhã e... preciso dormir. Saia do meu quarto!"
   É claro! Só podia ser isso. Algum veterano de seu alojamento tentando pregar-lhe uma peça. Ele entra no meio da noite e tenta assustar a caloura... Resolvido! Tinha inclusive um palpite.
   "Bruno... Saia logo daí! Eu sei que está..."
    Ora, tolinha. Se você é capaz de acordar com uma luz vermelha, acendendo abaixo de sua cama, porque não acordaria com os barulhos de Bruno abrindo a porta? 
    Carolina deu um pulo e mudou-se de posição. Agora deitava-se de costas para o colchão. As unhas cravavam na coberta. Ela suava e os calafrios vinham incessantemente. A voz daquela constatação um tanto admirável e assustadora não era de sua própria mente. Ela ouvira em sua cabeça, mas não era a sua própria voz mental! Era como um ser maligno e debochante deitasse acima dela, com seu corpo sem forma, e dissesse tais palavras telepaticamente para desesperá-la.
   O pânico a consumia. Ela rangia os dentes e os olhos arregalados iam e viam, da esquerda para direita e depois ao contrário. Frenéticos. Numa correria lunática. Suas unhas quebraram-se no cobertor que ela apertava e exercia uma força inumana. O sangue já caía dos dedos no cobertor branco, maculando-o. Ela ainda não sentia dor e tudo que podia ver era graças à luz vermelha.
   O que havia afinal abaixo da cama? Não era algo normal, sentia isso. Os instintos eram infalíveis, tinha certeza. Alguma coisa ruim acontecia ali. Alguma coisa invisível dançava ali, com um sorriso disforme e amedrontador. Dançava ao redor. O coração era uma zabumba em disritmia. Alguma coisa ruim está acontecendo aqui...
   Então lembrou-se da canção que sua mãe cantava. Cantava muito antes de ter fugido. Muito antes de cair o primeiro dente de leite de sua filha. Carol começou a cantar em voz bem alta:
   "Quando algo ruim acontecer, cante bem alto essa canção..."
   "... A ajuda virá, pois ela está em seu coração." Completou. Era a voz de sua mãe desaparecida! Estava embaixo de sua cama... Junto à luz rubra! A certeza veio ao lado do pânico.
   Carolina não sabia rezar direito, mas puxou em sua cabeça diversas partículas de orações como se fosse uma. Um pedido desesperado de qualquer ajuda que fosse.
   "Não tenha medo, minha filha, venha me ver aqui embaixo. Estou com saudade."
   Carol gritou estridentemente, o mais alto que pôde.
    Você não deveria ter gritado. Falou a voz maligna em sua cabeça. Então levantou-se vagarosamente. Levantou-se o que quer que estivesse ali embaixo. Ela pode ouvir os ruídos que se aproximava. A coisa então parou à margem da cama. Podia sentir uma respiração quente. Então aquilo abriu os olhos e todo o quarto (agora não apenas abaixo do leito) inundou-se da luz rubra.
    Ali estava a fonte da iluminação vermelha: os olhos de um homem de três metros que se agachava por causa do teto. Ele a fitava com seus olhos vermelhos sem piscar. Olhos iluminados. Iluminados de maldade pura.

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